*Extraído do Jornal “A Cidade”, 16 de Janeiro de
1949, José Ribeiro da Costa.
Você
conheceu o “Mineiro”? Era um pobre diabo que vivia pelas ruas da nossa Pouso
Alegre. Quem, nascido nos primórdios deste século, não brincou com o “Mineiro”?
Lembro-me ainda, e parece-me vê-lo agora, na hora do almoço e do jantar, com
aquela barba ruiva e cerrada, com aqueles cabelos crespos, sentado na soleira
da porta da minha casinha, lá na Rua do Brejo, muito gordo, coçando a cabeça ou
tirando “bichos-do-pé” e, a toda hora, chamando o “estrepinho” para que fosse
buscar a sua “boia”, pois tinha de ir comer em outros lugares. Um verdadeiro
Pantagruel. E, assim, ele passava o dia, de porta em porta, sempre comendo.
Depois ia procurar caixas de fósforos para a sua FABRICA de castiçais lá em
baixo do coreto do Palácio do Bispo, onde tinha como única companhia uma arara
muda e enfezada que nunca disse uma palavra siquer. Mas... quem era “Mineiro”?
Pouca gente sabia que um dia ele deixou a boa terra, a Baía de São Salvador, do
Senhor do Bonfim e apareceu neste recanto sagrado de Minas. Como, para nós, quasi
todos nortistas são baianos, ele contrariou a regra. Era baiano e ficou
“mineiro”. Seu nome? Ninguém soube. Para que? Chamavam-no “Mineiro” e ele
atendia. Era o bastante. Uma das suas manias, além dos castiçais de caixas de
fósforos, era lavar o nariz, para aspirar, tudo o que achava. Um pau de
fósforo, um cavaco de pau ou de vidro, ia logo às narinas largas para cheirar.
Todas as tardes, lá na vargem da Câmara estava ele revolvendo o lixo que o
Arlindo deixava, cheirando tudo que pegava. Um dia ele achou um vidro fechado.
Abriu-o e levou-o ao nariz, tombando desacordado, para recuperar os sentidos
e... perder a razão daí há pouco. E o “Mineiro” inofensivo, o “Mineiro” que
vivia rodeado de “estrepinhos”, passou a fazer medo. Levaram-no para Barbacena,
e disseram, mais tarde, que ele havia tomado o famoso “chá da meia noite”.
Muita
gente sentiu a morte do “Mineiro”... Mas, ele não morreu. Alguém, visitando
aquele hospício, ao passar por um cubículo, ouviu uma voz conhecida chamando-o:
“Estrepinho... oh! Estrepinho”,. Era o “Mineiro”. Perguntou de tudo e de
todos... queria noticias de Pouso Alegre... da sua garotada. Eu sei que este
alguém, ao se despedir de “Mineiro”, ao apertar as suas mãos, tinha os olhos
marejados de lagrimas. O “Mineiro” não estava mais louco... mas estava
abobalhado, sem, contudo, esquecer do seu Pouso Alegre e da sua gente... e ele
nunca mais voltou. Teria morrido mesmo? Faz tantos anos... e é por isso que
somente aqueles que nasceram nos primórdios deste século, sabem quem foi o
“Mineiro”, e ainda sentem saudades dele, por que ele faz parte da nossa
infância...
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